O Uruguai se tornou, nesta quarta-feira (15/10), o primeiro país da América Latina a aprovar por lei a eutanásia, após um debate de dez horas no Parlamento. A nova legislação, chamada “Muerte Digna” (Morte Digna), permite que adultos em fase terminal, portadores de doenças incuráveis ou que enfrentem sofrimento insuportável, possam escolher morrer com dignidade sob supervisão médica.
O projeto foi aprovado por 20 dos 31 legisladores presentes, encerrando um processo legislativo de cinco anos que mobilizou a sociedade uruguaia. Segundo pesquisa da consultoria Cifra, 62% da população apoiava a proposta.
“Passar pelos últimos estágios da vida com dignidade, sofrendo de uma doença incurável e irreversível, com sofrimento insuportável e deterioração grave da qualidade de vida, não é crime”, afirmou o senador Daniel Borbonet, da Frente Amplo, durante o debate.
A medida contou com apoio de partidos de esquerda e centro-direita, mas enfrentou resistência de setores conservadores e grupos religiosos, especialmente da Igreja Católica.
Situação nos outros países da América Latina
Embora o Uruguai seja o primeiro país latino-americano a regulamentar a eutanásia por lei, outros países já descriminalizaram ou flexibilizaram o procedimento por decisão judicial.
Colômbia
A Colômbia foi pioneira na região, descriminalizando a eutanásia em 1997 e tornando-a legal em 2015. Em 2021, o país ampliou o direito para pessoas que sofrem intensamente com doenças incuráveis, mesmo sem estarem em fase terminal. Entre 2015 e 2023, foram realizadas 692 mortes assistidas no país.
Equador
Em 2024, o Equador se tornou o segundo país da América Latina a descriminalizar a morte assistida. A decisão veio após o caso de Paola Roldán, paciente com esclerose lateral amiotrófica (ELA), que recorreu à Justiça pedindo o direito de encerrar a própria vida. A Corte Constitucional considerou a eutanásia constitucional em casos de sofrimento grave e irreversível.
Cuba
Em 2023, Cuba aprovou uma lei que reconhece o direito à morte digna, permitindo a limitação do esforço terapêutico e o acesso a cuidados paliativos — um marco que abre espaço para futuras discussões sobre eutanásia ativa.
Peru
No Peru, a eutanásia é ilegal, mas em 2021 a Justiça autorizou Ana Estrada, portadora de uma doença degenerativa rara, a realizar o procedimento — tornando o caso uma exceção individual no país.
Brasil
No Brasil, a eutanásia continua proibida por lei. O Conselho Federal de Medicina autoriza apenas a ortotanásia, ou seja, a suspensão de tratamentos que prolonguem artificialmente a vida de pacientes terminais, mediante consentimento.
México, Argentina e Chile
Esses países ainda não legalizaram a eutanásia, mas permitem que pacientes em estado terminal recusem tratamentos paliativos ou intervenções invasivas, prática conhecida como eutanásia passiva.
O Chile analisa, desde 2020, um projeto de lei que pode autorizar a morte assistida sob condições específicas.
Contexto internacional
Fora da América Latina, Suíça, Países Baixos, Bélgica, Luxemburgo, Espanha e Áustria já legalizaram a morte assistida.
Nos Estados Unidos, dez estados e Washington D.C. permitem o procedimento, enquanto o Canadá aprovou a prática em 2016 e ampliou o escopo em 2021.
A Suíça, pioneira desde 1942, é também um dos poucos países onde estrangeiros podem recorrer à eutanásia, através de organizações como a Dignitas.
A decisão do Uruguai marca um novo capítulo ético e médico na América Latina, reacendendo o debate sobre autonomia, dignidade e direitos individuais no fim da vida.