Documentos recém-divulgados pelos Arquivos Nacionais do Reino Unido revelam um lado pouco conhecido da preparação dos aliados para o Dia D, o desembarque na Normandia, em 6 de junho de 1944. Entre eles, destaca-se um bilhete escrito à mão pelo então primeiro-ministro britânico, Winston Churchill, no qual ele expressa sua preocupação e frustração com a falta de penicilina — um medicamento que, na época, era considerado uma verdadeira “droga milagrosa”.
Os registros mostram como Churchill se angustiava com a incapacidade da Grã-Bretanha de produzir penicilina em larga escala, principalmente quando comparado aos avanços dos Estados Unidos. Isso, apesar de a penicilina ter sido descoberta em solo britânico pelo cientista Alexander Fleming, em 1928.
A corrida contra o tempo pela “droga milagrosa”
A penicilina foi descoberta por acaso, mas sua aplicação prática só começou a ser desenvolvida durante a Segunda Guerra Mundial. A equipe da Universidade de Oxford, liderada por Howard Florey, realizou os primeiros testes bem-sucedidos. Entretanto, a produção industrial no Reino Unido era limitada, o que levou os pesquisadores a buscarem apoio nos EUA, onde a indústria farmacêutica tinha maior capacidade de expansão.
Sem antibióticos, ferimentos simples poderiam rapidamente evoluir para infecções fatais por septicemia. Diante da expectativa de milhares de feridos no Dia D, garantir o fornecimento adequado de penicilina se tornou questão de vida ou morte.
A pressão pessoal de Churchill
Em janeiro de 1944, Churchill anotou em vermelho no relatório do Ministério do Abastecimento:
“Sinto muito por não podermos produzir mais.”
Em outro documento, mais incisivo, escreveu:
“Quero propostas para um fornecimento mais abundante da Grã-Bretanha.”
Quando informado de que a produção britânica atenderia apenas um décimo da meta estimada, classificou o resultado como “muito decepcionante”, reforçando seu temor de que a falta de penicilina colocasse em risco as operações militares.
Suprimento garantido — mas só para os militares
Poucos dias antes do Dia D, as autoridades confirmaram que os suprimentos haviam sido garantidos, quase todos vindos dos EUA, mas seriam destinados exclusivamente aos feridos em combate. Civis continuaram sem acesso até o fim da guerra.
Um telegrama de um médico na Cornualha, que tentava obter penicilina para uma criança de 10 anos, mostra o drama da época:
“Não há esperança sem penicilina.”
O pedido foi negado — a prioridade era total para os militares.
O legado da corrida pela penicilina
Os documentos revelam não apenas o esforço bélico, mas também os primórdios da era dos antibióticos, que hoje fazem parte do cotidiano. A penicilina só se tornou disponível para a população geral no Reino Unido em 1946, após o fim da guerra.
A pressão exercida por Churchill e seu governo para garantir o medicamento reflete um momento crucial da história da medicina e da guerra, mostrando como a ciência e a logística médica foram tão decisivas quanto as armas no maior conflito da história moderna.