O enfrentamento às arboviroses no Brasil acaba de atingir um novo patamar com a inauguração da maior biofábrica do mundo dedicada à produção de mosquitos Aedes aegypti com a bactéria Wolbachia. A unidade, denominada Wolbito do Brasil, está localizada na Cidade Industrial de Curitiba (PR) e foi inaugurada oficialmente no dia 19 de julho de 2025, com a presença do ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
O empreendimento é fruto de uma parceria estratégica entre o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP), vinculado à Fiocruz e ao Governo do Paraná, e o World Mosquito Program (WMP), organização global sem fins lucrativos especializada em soluções inovadoras para o controle de doenças transmitidas por mosquitos. A iniciativa integra o esforço do Ministério da Saúde (MS) para incorporar o Método Wolbachia como uma das estratégias permanentes no combate à dengue, zika e chikungunya em território nacional.
Capacidade recorde e abrangência nacional
Com mais de 3.500 m² de área construída e infraestrutura de alta tecnologia, a biofábrica conta com cerca de 70 profissionais especializados e equipamentos de automação de última geração. Sua capacidade de produção ultrapassa 100 milhões de ovos de mosquitos com Wolbachia por semana, tornando possível ampliar o alcance do método para novas regiões do país. Inicialmente, a distribuição dos chamados “Wolbitos” atenderá exclusivamente à demanda do Ministério da Saúde, com foco em localidades de alta incidência de arboviroses.
“O impacto das arboviroses na saúde pública é imenso. A Fiocruz mantém seu compromisso com a ciência e a tecnologia aplicadas à promoção da saúde no contexto do Sistema Único de Saúde. A inauguração da Wolbito do Brasil é mais um passo concreto nessa direção”, afirmou o presidente da Fiocruz, Mario Moreira.
Atualmente, o Método Wolbachia já beneficiou cerca de 5 milhões de brasileiros. Com a expansão prevista, a expectativa é atingir até 70 milhões de pessoas nos próximos anos.
Histórico, abrangência e resultados
O Método Wolbachia está em uso no Brasil há pouco mais de uma década, com resultados expressivos. Em Niterói (RJ), a primeira cidade totalmente coberta pela estratégia, estudos preliminares indicam uma redução de até 69% nos casos de dengue.
Até o momento, a tecnologia foi aplicada em oito municípios brasileiros: Niterói e Rio de Janeiro (RJ), Londrina e Foz do Iguaçu (PR), Campo Grande (MS), Joinville (SC), Belo Horizonte (MG) e Petrolina (PE). Atualmente, está em fase de implantação em Presidente Prudente (SP), Uberlândia (MG) e Natal (RN). A seleção das cidades é realizada pelo Ministério da Saúde com base em critérios técnicos e epidemiológicos. A implementação, por sua vez, é conduzida pela equipe técnica da Wolbito do Brasil com o suporte da Fiocruz.
Outros municípios já estão em fase de engajamento e preparação, como Balneário Camboriú e Blumenau (SC), novas áreas de Joinville, Valparaíso de Goiás e Luziânia (GO), além do Distrito Federal.
Funcionamento do Método Wolbachia
O Método utiliza mosquitos Aedes aegypti inoculados com a bactéria Wolbachia, presente naturalmente em cerca de 60% dos insetos na natureza. Essa bactéria impede a multiplicação dos vírus da dengue, zika e chikungunya dentro do organismo do mosquito, reduzindo a transmissão das doenças para os seres humanos. Quando os mosquitos com Wolbachia se reproduzem, transmitem a bactéria às gerações futuras, promovendo um efeito duradouro e autossustentável.
Antes da liberação dos mosquitos, são realizadas ações de comunicação e engajamento social, fundamentais para o sucesso da estratégia. Essas atividades envolvem campanhas educativas em escolas, unidades de saúde, rádios, redes sociais e rodas de conversa com a comunidade. Após essa etapa, os Wolbitos são liberados semanalmente por um período previamente estabelecido, com o objetivo de estabilizar a presença da bactéria na população local de mosquitos.
Luciano Moreira, CEO da Wolbito do Brasil e um dos responsáveis pela introdução do método no país, enfatiza: “Nosso método é seguro, natural e complementar a outras ações de controle. A comunicação com a população é essencial, pois o engajamento comunitário amplia o impacto e a sustentabilidade da estratégia.”
Economia e impacto em saúde pública
Além dos benefícios diretos na redução de casos, o Método Wolbachia representa significativa economia para o sistema público de saúde. Estudos estimam que para cada R$ 1,00 investido na tecnologia, a economia gerada em medicamentos, internações e tratamentos pode variar entre R$ 43,45 e R$ 549,13.
Importante destacar que os mosquitos Wolbitos não são transgênicos e que o método não substitui outras ações preventivas, como a eliminação de criadouros. Ele atua de forma integrada ao conjunto de políticas públicas de vigilância e controle das arboviroses.
Trajetória científica
O desenvolvimento do Método Wolbachia teve início em 2008, na Universidade de Monash, em Melbourne (Austrália). O próprio Luciano Moreira, à época pesquisador da Fiocruz, participou da pesquisa inicial que adaptou a Wolbachia, extraída da mosca-da-fruta, ao Aedes aegypti. No Brasil, os primeiros testes ocorreram em 2014 nos bairros de Tubiacanga (Rio de Janeiro) e Jurujuba (Niterói), com apoio da Fiocruz e do World Mosquito Program. Desde então, a estratégia vem sendo ampliada nacionalmente com base em evidências científicas robustas.
Com a inauguração da Wolbito do Brasil, o país assume protagonismo mundial no enfrentamento de arboviroses, unindo ciência, inovação tecnológica e políticas públicas de saúde com potencial de impacto direto sobre milhões de vidas.
