Uma nova revisão científica, publicada em maio de 2025 no periódico Pharmacology & Therapeutics, aponta que compostos presentes na cannabis — os canabinoides — podem potencializar a eficácia de quimioterápicos e minimizar efeitos adversos comuns da quimioterapia. O estudo foi conduzido por pesquisadores do Instituto de Farmacologia e Toxicologia da Universidade de Rostock, na Alemanha.
A revisão analisou dados de estudos clínicos e pré-clínicos que avaliaram o impacto dos canabinoides em diversos tipos de câncer, incluindo glioblastoma, leucemias, câncer de mama e outros tumores sólidos. Os pesquisadores destacam dois benefícios principais da combinação entre canabinoides e quimioterápicos: a superação de resistências ao tratamento, o que pode resultar em maior tempo de vida para os pacientes, e a redução de sintomas como náusea, dor, neuropatia periférica, mucosite e complicações renais e cardíacas.
Entre os estudos analisados, destaca-se um ensaio clínico de fase 1b, realizado em 2021, que avaliou a administração de um spray oral à base de THC e CBD combinado com temozolomida, um quimioterápico utilizado no tratamento de glioblastomas. Os resultados indicaram que os pacientes que receberam a combinação apresentaram uma sobrevida maior em comparação com aqueles tratados apenas com o quimioterápico.
A revisão também confirma a eficácia dos canabinoides no alívio de sintomas comuns da quimioterapia, como náuseas, neuropatia periférica induzida por quimioterapia (CIPN), inflamações na bexiga, lesões orais e complicações cardíacas e renais. Este reconhecimento é corroborado por uma meta-análise da Frontiers in Oncology, que revisou mais de 10 mil artigos científicos, revelando que os efeitos terapêuticos da cannabis em pacientes oncológicos são amplamente reconhecidos — para cada estudo que indicava baixa eficácia, havia três demonstrando benefícios claros.
Ryan Castle, diretor do Whole Health Oncology Institute e autor principal da meta-análise, destacou:
“Esse é um dos reconhecimentos mais expressivos do valor terapêutico da cannabis no contexto do câncer já observados pela comunidade científica.”
Adicionalmente, instituições como a Discover Oncology e o National Cancer Institute dos Estados Unidos vêm documentando o uso crescente da cannabis entre pacientes oncológicos, especialmente para o controle da dor, ansiedade e distúrbios do sono.
Apesar dos avanços, os pesquisadores da Universidade de Rostock alertam para a necessidade de mais ensaios clínicos controlados que aprofundem o conhecimento sobre as interações entre canabinoides e diferentes quimioterápicos, bem como sobre as vias de administração mais seguras e eficazes. Eles também ressaltam que aspectos como angiogênese, metástase e invasão celular relacionados ao uso dos canabinoides ainda precisam ser melhor compreendidos.
O estudo enfatiza que, embora o uso da cannabis como planta medicinal seja milenar, o avanço científico acerca de seus mecanismos só ganhou força a partir da década de 1990, com a descoberta do sistema endocanabinoide.
Em um momento em que o Brasil avança gradualmente na regulamentação da cannabis medicinal, pesquisas como essa reforçam a necessidade de políticas públicas baseadas em evidências científicas, da ampliação do acesso aos tratamentos, da redução de barreiras econômicas e regulatórias, e do incentivo a ensaios clínicos locais que validem esses achados no contexto brasileiro.