A Comissão Europeia (CE) aprovou nesta terça-feira (26) a comercialização do Yeytuo (lenacapavir) para uso como profilaxia pré-exposição (PrEP), medida que reduz o risco de infecção pelo HIV. Desenvolvido pela farmacêutica norte-americana Gilead Sciences, o medicamento se torna a primeira e única opção de PrEP semestral aprovada para uso nos 27 países da União Europeia, além de Noruega, Islândia e Liechtenstein.
A autorização, concedida após avaliação acelerada pelo Comitê de Medicamentos para Uso Humano (CHMP) da Agência Europeia de Medicamentos (EMA), coloca o Yeytuo como uma alternativa inovadora e de longa duração no combate à epidemia de HIV. O fármaco já havia recebido aprovação da Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos e conta com recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS).
De acordo com a CE, a aprovação representa um avanço diante do cenário atual: todos os anos, cerca de 25 mil novos diagnósticos de HIV são registrados na União Europeia e no Espaço Econômico Europeu. Para Jean-Michel Molina, professor da Université Paris Cité, a decisão pode ter impacto direto na saúde pública.
“Com cerca de 25.000 novos diagnósticos de HIV na União Europeia e no Espaço Econômico Europeu a cada ano, fica claro que as opções atuais de prevenção não estão funcionando para todos que precisam ou desejam, especialmente entre as populações vulneráveis”, afirmou Molina em comunicado.
“O novo esquema de dosagem semestral e a alta eficácia do Yeytuo podem ser a opção transformadora de prevenção do HIV na Europa que esperávamos para nos ajudar a reduzir novas infecções e alcançar um progresso real em direção ao fim da epidemia de HIV”, completou.
Evidências clínicas
A decisão da CE foi baseada em ensaios clínicos de fase 3 publicados no The New England Journal of Medicine. No primeiro estudo, realizado com 2.134 mulheres cisgênero, a administração semestral do lenacapavir demonstrou eficácia total: nenhum caso de infecção por HIV foi registrado no grupo que recebeu a injeção, em contraste com participantes que tomavam o Truvada oral diariamente.
Um segundo estudo, que incluiu 2.179 homens cisgênero e pessoas de gênero fluido, registrou apenas duas infecções entre os participantes que receberam o lenacapavir. Isso corresponde a uma taxa de proteção de 99,9%, com resultados superiores ao regime oral diário com Truvada.
Mecanismo de ação inovador
O lenacapavir atua por um mecanismo distinto dos antirretrovirais convencionais. Enquanto a maioria desses medicamentos interfere na produção do material genético do HIV, o lenacapavir bloqueia a formação do capsídeo viral, estrutura responsável por proteger o RNA do vírus e permitir sua entrada nas células humanas. Sem o capsídeo, o vírus perde a capacidade de se replicar.
Outro diferencial está na forma de administração: a substância é aplicada por injeção subcutânea, geralmente na região abdominal, onde é armazenada no tecido adiposo. A liberação ocorre de maneira lenta e contínua, garantindo proteção por até seis meses. Após esse período, é necessária apenas uma nova aplicação para manter o efeito.
Disponibilidade no Brasil
Embora já aprovado na Europa e nos Estados Unidos, o lenacapavir ainda não está disponível no Brasil. Em 3 de abril deste ano, a Gilead protocolou junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) o pedido de registro do medicamento como opção de PrEP no país.
Especialistas apontam que a chegada dessa nova modalidade de prevenção pode representar um marco para o enfrentamento da epidemia, oferecendo maior comodidade, adesão e eficácia, sobretudo para populações vulneráveis que encontram dificuldades em manter regimes diários de medicação.