Pesquisadores brasileiros demonstraram que nanopartículas de prata produzidas pelo fungo Trichoderma reesei podem atuar na prevenção e tratamento da Covid-19. Estudos realizados em hamsters indicaram que as nanopartículas não apenas inibem a infecção pelo SARS-CoV-2, como também reduzem a carga viral nos pulmões e amenizam a inflamação aguda associada à doença. Os resultados abrem caminho para o desenvolvimento de sprays nasais e outros produtos voltados ao combate de diversas doenças virais, como HIV/Aids, herpes-zóster e gripe.
A pesquisa, financiada pela Fapesp e publicada na revista Current Research in Biotechnology, destaca o potencial das nanopartículas de prata devido à sua afinidade por proteínas. De acordo com Roberto do Nascimento Silva, professor do Departamento de Bioquímica e Imunologia da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FMRP-USP) e autor do estudo, análises computacionais mostraram que as nanopartículas produzidas em laboratório se ligam à proteína spike do SARS-CoV-2, impedindo a entrada do vírus nas células hospedeiras em aproximadamente 50%.
Além da ação preventiva, os testes em hamsters demonstraram efeitos anti-inflamatórios relevantes, com a redução da inflamação pulmonar aguda, uma das complicações mais graves da Covid-19. Os pesquisadores observaram que as nanopartículas inibem a ativação do inflamassoma — complexo proteico envolvido na tempestade de citocinas — e a produção de interleucina-1beta (IL-1β), proteína-chave na resposta inflamatória.
O estudo foi desenvolvido em parceria com instituições como a Fiocruz, a Universidade Federal de Alagoas (Ufal) e a Universidade de Brasília (UnB). As nanopartículas de prata foram obtidas por meio de processos biotecnológicos sustentáveis, evitando o uso de agentes químicos tóxicos. No laboratório, o fungo T. reesei foi cultivado em condições de baixo oxigênio, produzindo enzimas redutoras que transformam prata em nanopartículas de formato esférico. Essas enzimas e proteínas atuam como agentes redutores e estabilizantes, permitindo o controle preciso do tamanho e formato das partículas.
A produção biológica de nanopartículas de prata, segundo Silva, representa uma solução sustentável com aplicação potencial em sprays nasais, desinfetantes, revestimentos antimicrobianos e dispositivos médicos. Inicialmente voltado para a pesquisa em combate a células tumorais mamárias, o projeto foi direcionado para o enfrentamento da Covid-19 durante a pandemia. O grupo também explora aplicações contra outros vírus, como HIV e herpes.
Apesar do custo elevado da prata, o processo de produção escalonada permite a geração de produtos de baixo custo. Os pesquisadores utilizaram doses dez vezes menores que o nível considerado tóxico, e observaram que o organismo é capaz de eliminar o metal em até oito semanas. De acordo com Silva, os próximos passos incluem o desenvolvimento de uma formulação farmacêutica patenteada e o início de testes clínicos.