Um novo estudo realizado por cientistas britânicos sugere que um simples teste de saliva pode transformar a forma como o câncer de próstata é detectado precocemente. A pesquisa, publicada na prestigiada revista New England Journal of Medicine, investigou o uso da análise genética da saliva como ferramenta para identificar homens com maior risco de desenvolver tumores agressivos.
Como o teste funciona
Diferente dos exames tradicionais, o teste de saliva não procura sinais diretos da doença. Em vez disso, ele analisa o DNA do paciente, em busca de 130 mutações genéticas conhecidas por aumentar o risco de câncer de próstata. A partir desses dados, os pesquisadores calcularam o grau de risco dos participantes — homens entre 55 e 69 anos — e convidaram os 10% com pontuação mais alta para exames complementares, como ressonância magnética e biópsia da próstata.
Os resultados foram expressivos:
- 745 homens foram classificados como de alto risco;
- 468 aceitaram realizar os exames adicionais;
- 187 foram diagnosticados com câncer de próstata;
- 103 apresentavam tumores agressivos que requeriam tratamento imediato;
- 74 desses casos não teriam sido identificados no estágio atual pelos métodos convencionais.
O potencial de uma abordagem personalizada
De acordo com Ros Eeles, pesquisadora do Instituto de Pesquisa do Câncer de Londres, o teste representa uma oportunidade de “virar o jogo” no combate ao câncer de próstata. A proposta é identificar precocemente os indivíduos com maior risco e evitar exames desnecessários em quem tem baixo risco, promovendo uma abordagem mais precisa e personalizada.
Exemplo real: duas vidas impactadas
O estudo já começou a gerar histórias reais de impacto. Dheeresh Turnbull, de 71 anos, participou da pesquisa e descobriu que tinha um tumor, mesmo sem histórico familiar da doença. Seu irmão mais novo também foi diagnosticado após entrar no estudo. “Graças a esse teste, duas vidas foram salvas na minha família”, afirmou.
Ainda há desafios pela frente
Apesar dos resultados animadores, os especialistas reforçam que o teste ainda não está pronto para ser implementado de forma ampla na prática clínica. Dusko Ilic, professor da King’s College London, afirma que a melhora na detecção foi “modesta” e ainda não há provas de que o teste aumenta a sobrevida ou melhora a qualidade de vida dos pacientes.
Além disso, a pesquisa se concentrou em homens de origem europeia, e ainda há necessidade de validação em grupos étnicos diversos, especialmente entre homens negros — que têm o dobro do risco de desenvolver câncer de próstata.
Também há questões em aberto sobre custo-benefício, momento ideal para testagem e os possíveis efeitos colaterais psicológicos da classificação de risco genético.
Próximos passos
O teste agora integra o estudo Transform, que busca encontrar a melhor forma de implementar o rastreamento do câncer de próstata no Reino Unido, de forma segura, eficaz e baseada em evidências. Para Michael Inouye, professor da Universidade de Cambridge, este estudo pode ser um marco no uso da genética para prevenir doenças. No entanto, ele alerta: “Ainda levará alguns anos até vermos esse tipo de teste integrado ao sistema de saúde”.